O comércio da dor

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O conceito da dor é muito complexo e não menos subjetivo para a psicologia, pois ela pode ser percebida como algo fisiológico ou emocional e ainda possuir uma intensidade variável para cada tipo de indivíduo. Até mesmo no aspecto da tolerância, que será bem variável na experiência de cada um. No entanto, estamos vivendo uma “era mágica” que vendeu uma ideia falsa de vida sem dores e os profissionais da saúde responderam este clamor, trabalhando intensamente sobre essa demanda mundial de sedação aos seus primeiros sinais e sintomas, mas ignorando o principal:

A etiologia da dor, que temuma mensagem real para o corpo que sofre muitas agressões exógenas todos os dias. E, é justamente aqui que começa o grande problema da humanidade!

Criamos uma sociedade que busca cada vez mais o prazer instantâneo sem se importar com qualquer tipo de efeito colateral posterior, pois acreditamos inocentemente no paliativo do “comprimido mágico” para lidar com as consequências daquele excesso de prazer. Afinal, temos a droga na farmácia que vai trazer o alívio tão prometido nas propagandas e no senso comum, sem maiores consequências para a saúde como um todo.

Na verdade, acabamos criando dores muito mais intensas com o tempo prolongado de uso desses fármacos milagrosos e, dessa vez, não serão mais dores ocasionais, serão dores crônicas e bem difíceis de serem tratadas, pois é assim que observamos na prática clínica. O fato de você não querer ler a bula do medicamento, não anula os seus efeitos colaterais e possíveis eventuais efeitos rebotes quando são usados sem limites ou critérios científicos. E olha que não vamos dissertar aqui sobre a automedicação, o que elevaria o problema para máxima potência destruidora do organismo com a promessa de um desastre a vista com grandes proporções para aqueles que sofrerão também por um padecimento inconsciente equivalente ao processo de suicídio lento e doloroso.

Na minha experiência clínica, já tratei pacientes com dores terríveis que nenhum medicamento alopático entregava bons resultados e a sedação através da acupuntura, hipnose e com a psicoterapia pontual, conseguíamos aliviar os sintomas. Lembrando que certas dores são intensificadas na mente adoecida do paciente associada com as suas mágoas e frustrações, aparentemente incuráveis do seu passado com escolhas infelizes.

Dentro deste cenário dramático da dor, o comércio das drogas entrou em cena quando enxergou uma oportunidade única de lucrar bilhões de dólares, pois quem sente dor, paga qualquer valor para se anestesiar e foi nesta ótica perversa que os opioides entraram em cena no formato de drogas lícitas (salvadoras da pátria), pois são substâncias que podem ser produzidas em larga escala por laboratórios poderosos que querem faturar alto, viabilizando industrialmente o seu o consumo legal. Não vou detalhar os pormenores de substancias como o álcool, a nicotina, etc. pois precisaria escrever um livro para isto. Desejo apenas focar em algo não menos avassalador do que a morfina, a codeína, oxicodona e fentanil que, infelizmente, são capazes de trazer um alívio quase imediato no início, mas não tardará em trazer também uma conta muito alta que não será paga apenas com dinheiro, mas com a sua vida.

A dependência acontece e as vendas explodem na mesma proporção, se transformando em máquinas de fazer fortunas, gerando e criando histórias de overdose que escalam a tragédia social. É o que acontece sempre quando nos tornamos dependentes físicos e psicológicos de qualquer coisa fora de nós mesmos no desespero de encontrar um alivio falso para as nossas dores a qualquer custo.

Sim! Precisamos falar muito sobre o crescimento desse comércio legal, especialmente de opioides que são atravessados (roubados) por traficantes comuns que capturam cargas desses medicamentos nas estradas públicas para serem usados no mercado negro como mais uma droga qualquer, piorando o gráfico negativo da saúde pública no nosso país (ver no Google: “crescimento do fluxo das cracolândias no Brasil”).

O singelo e despretensioso objetivo deste artigo foi apenas lançar mais uma luz sobre este assunto devorador de vidas e ajudar na expansão da sua consciência, talvez, quem sabe, cair nas mãos de legisladores sérios que trabalhem por uma regulamentação mais rigorosa no controle desse comércio vergonhoso das drogas lícitas no nosso país, (especialmente opioides), monitorando prescrições médicas, gerando políticas e educação pública nas escolas que devem defender a valorização da vida. Eu sei que é uma queda de braço com os poderosos laboratórios, mas quer saber de uma coisa? Essa é uma das poucas guerras que realmente vale a pena combater para salvar milhões de vidas que serão salvas em todo planeta ou não… Se nada for feito.


www.drmarcoscalmon.com.br                                                                               psicologo@drmarcoscalmon.com.br

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