Redenção, Liberdade e Central do Brasil no Oeste – Relatos do Mundo

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Bem, de todas as pessoas e a duplas entre diretor/ator que poderia se imaginar, aqui temos Paul Greengrass, melhor conhecido como o ‘câmera com doença de Parkinson’ dos filmes da franquia Bourne, dirigindo aqui um faroeste e estrelando o sempre querido Tom Hanks, sendo este mais um veículo de estrela para ele. Tudo parece soar como algo mais do que interessante do que pode ser suficiente para defini-lo, especialmente por ter esses dois nomes à frente do projeto e que são completamente o oposto do que se poderia imaginar sendo encaixados em um cenário do gênero faroeste (bem, se você não contar Woody do Toy Story). E que se apresenta aqui de forma oras bem ambiciosa, embora pouco tímida e convencional em sua elaboração.

Como um faroeste, é bem decente, parte “revisionista” por sua natureza técnica e tom fortemente dramático, silencioso e contemplativo, mas também muito classicista em sua essência. Chegou até um momento em que quase desmaiei em choque quando vi algo inacreditável acontecendo no filme, que é Greengrass dirigindo tomadas que duram mais de cinco segundos e com a câmera realmente estável e até usando planos mais longos em algumas cenas. Conhecendo seu histórico, sabe que isso é quase que um evento revolucionário! Bem, na verdade nem tanto, ele ainda usa câmera-na-mão muitas vezes (nunca pensaria ao ver câmeras portáteis em um faroeste em minha vida), ainda na sua tentativa marca de querer extrair o realismo palpável de cada uma das cenas, enquanto que sua característica montagem rápida/frenética é restrita em uso para alguns dos poucos tiroteios e cenas de “ação” (se é que se podem se chamar assim) do filme.

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Nada a muito a se destacar aí também, mas o primeiro momento desses que se toma no filme em perspectiva, tende a se arrastar seu ‘momentum’ na tentativa criar uma dose de tensão realista que talvez não consiga sustentar as suas bem intencionadas intenções, mesmo que vinha funcionando no início da sequência com um suspense e violência realmente palatáveis e que dão a sensação de realismo imersivo dentro desse mundo. Ao mesmo tempo em que deixa o resto do filme carregar uma direção mais direta e “padrão”, que ora tanto carrega uma aparência tão épica, como também busca ser o mais intimamente dramático possível em seu enredo formado ao redor da usual trama que já se tornou tão comum e quase padrão de filmes (e até séries) recentes em fazer, que é a ‘figura paterna e sua jovem protegida em uma perigosa aventura’ que se estabelece entre o personagem de Hanks – Capitão Kidd, e a garotinha Johanna (Helena Zengel).

Onde mesmo que não se destaque em nada particularmente único, fora o fato de que eles não falam a mesma língua, sendo ela foi criada por indígenas Kiowas e também uma Alemã nascida. À medida que segue todos os passos previsíveis que você pode imaginar de uma típica história como essa, onde eles avançam juntos rumo a um futuro imprevisível à medida que aprendem a amar e a depender um do outro em sua longa jornada de sobrevivência. Possui alguns ecos de filmes como Bravura Indômita e Rastros do Ódio, esse último particularmente tendo traços muito similares, compartilhando um cenário de Faroeste pós-guerra civil, lidando com seus restos sociais desmoralizados, habitando entre ódio e indiferença, e tendo como personagem principal um veterano de guerra em uma jornada pessoal no meio de tudo.

Mas também carrega um pouco de … Central do Brasil de Walter Salles?! Sim, bastante na verdade. Basta trocar cartas por jornais como sendo a principal profissão de Kidd, que faz leituras públicas de notícias de jornal a cada cidade por qual passa. Assim, se entra nos temas que se é abordado no filme, e onde a sua “política” incide sobre o tema de que “todos estão sofrendo”, de uma forma ou de outra, seja do Norte, Sul, Esquerda ou Direita. Habitando um mundo/realidade onde todos estão afundados em revolta, cegos em ódio, onde más ações acontecem sem motivo, famílias e laços são esquecidos, o sofrimento é um sentimento mútuo entre todos, pois todos perdem e carregam seu ponto justificável de serem e agirem como tal, sejam os “heróis” aos “vilões”. Soou familiar?! Infelizmente, deve…

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Uma realidade palpável onde a notícia jornalística, a autêntica e real, é mostrada como um enaltecimento de paz, que traz a visão e a inspiração para se seguir em frente. Sério, acho que o clamor de “liberdade de censura” nunca foi posta de forma tão explícita assim em um faroeste antes! Tudo que dá muitas qualidades realmente interessantes e francamente atrativas que torna o filme instigante, mesmo que longe de ser excelente. A primeira metade é bem mais forte do que a última porque chega a um ponto em que não há mais o que dizer. Toda a aventura é envolvente e todos os encontros episódicos com cenários e personagens peculiares carregam todos os traços perfeitos para criar essa Odisséia de Homero original. Isso antes de traçar bem previsíveis notas dramáticas no final que quase caem no piegas, apesar da grande honestidade da atuação, e ainda embalando o coração que havia desenvolvido por quase duas horas até então.

Hanks está maravilhoso como de costume, mas a garota é incrível e a verdadeira estrela de grande parte do show aqui! Se há reais traços quase líricos na formação narrativa aqui se é graças a ela em cena e roubando a câmera de Hanks. E seus momentos juntos são o que realmente vende o filme em um todo coeso e muitas vezes emocionante. Assim como também se vale muito a pena em ver Greengrass fora de sua caixa de conforto e experimentar algo incomum em sua filmografia, mostrando um grande e profundo coração humanista pulsando dentro dele. Pode não ser um faroeste memorável ou contundente, mas tem o coração e o espírito de um dentro dele!

Raphael Klopper – estudante de jornalismo

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