Liga da Justiça: Triunfo Final de Zack Snyder!

40 min. leitura

Bem, aqui estamos, o filme que muitos diziam que não existia ou que nunca aconteceria, respira e afeta muitos, enfim entre nós. O texto vai ser longo e já peço desculpas de antemão, mas é um filme de 4 horas de duração que já era a um bom tempo esperado, então cooperem pois há muito a se falar e muito a se celebrar sobre aqui! E pra não perder tempo descrevendo em detalhes todo o drama por trás da produção do filme e da luta pessoal de Zack Snyder e o enorme movimento dos fãs que junto a ele lutaram para ter sua visão finalmente realizada (que realmente espero que façam um filme sobre isso um dia).

Já existe este ótimo artigo passando por tudo isso, então vou deixá-lo aqui para quem se dispor a ler em Inglês:

https://www.vanityfair.com/hollywood/2021/02/the-true-story-of-justice-league-snyder-cut

Embora eu não goste da parte em que falam sobre os “fãs tóxicos” que atacaram todos aqueles que criticavam ou zombavam da visão de Snyder e os próprios jornalistas que negavam a existência da versão de Snyder para o filme, porque os mesmos “atacados” muitas vezes zombavam do movimento à favor da do que ficou conhecico domo a “SnyderCut” (o corte do Snyder para sua versão do filme Liga da Justiça), chamando de causa perdida e que aqueles que apoiavam sua existência como uma minoria de malucos, ignorantes e viciados. 

E querendo com isso, enterrar de vez a má fama dos filmes da DC comandados ou imaginados por Snyder e deixar eles seguirem por um caminho mais comercialmente palatável com filmes de tons mais leves, e com mais liberdade criativa dada à produção e diretores, que certamente foi apoiado pelo próprio estúdio enquanto escondia seus erros sob debaixo do tapete do ego.

Bem, desde então, a DC vem trilhando um amplo caminho de sucesso, desde a comédia familiar de Shazam, a enorme e ambiciosa aventura épica de Aquaman, ou o estudo de personagem complexo e sombrio de Coringa, com a Warner Brothers tentando enterrar os filmes de Snyder como uma má memória do passado para o público. Mas, fora Homem de Aço e Batman V Superman, ninguém realmente se lembra do filme da Liga da Justiça de 2017, exceto apenas pelo terríveis efeitos criado pra esconder o bigode de Henry Cavill nas cenas em que ele foi trazido de volta para refilmar cenas novas para o filme, e cuja imagem perturbadora já se tornou iconicamente traumática na mente dos fãs. Pelo menos é a única memória que se tem do que foi um raso e incrivelmente esquecível filme.

Na época de seu lançamento, eu me enganei pensando que era um filme bom, mas depois de um tempo me deixou pensando: bem, eu quase não consegui ver nada do Zack naquele filme, é principalmente material do Whedon (diretor trazido para assumir as refilmagens) com toda certeza absoluta – os diálogos cafona tentando ser dramático, e o humor ainda mais cafona e exageradamente excêntrico. Mas então pensei: bem, talvez esse estilo mais MCU de humor e ação possa trazer a atenção e elogios que o DCEU precisa para conseguir seguir em frente e Whedon não é um mau cineasta de filmes de super-heróis, e com a liberdade certa ele pode sim fazer algo bom.

Mas agora, depois de ver a versão de Snyder… a verdade que recolhi de todo esse tempo me atingiu como a estaca atingindo o coração do Superman no final do BvS, que o que eles fizeram não foi um crime, hiperbolicamente falando, foi apenas uma atitude, ofensiva e sem coração de tirar um filme de um diretor, corrompendo e distorcendo sua visão original, enquanto jogava fora todo o conteúdo recheado de potencial que Snyder havia feito e os entregou em uma bandeja de prata. E trocar tudo isso por algo mais seguro e genérico para vender e fazer o público querer mais, algumas pessoas até elogiaram a Warner Bros por isso. As mesmas pessoas que podem apenas assistir a Liga da Justiça de Zack Snyder e apenas para falar mal gratuitamente do filme e ignorar o simples e verdadeiro fato: de que este é um filme estupendo!

É justo dizer que, desde a época do colapso do ‘Studio System’ no final dos anos 60, um movimento como esse nunca aconteceu, pelo menos não com essa força, para apoiar a visão original de um diretor ganhar vida. E olha que essa nem foi a primeira vez que algo assim aconteceu com um filme DC, na verdade a Donner Cut de Superman 2 também fora uma versão bem lembrada por ter vindo à vida graças ao apelo dos fãs para finalmente verem a visão original do grande Richard Donner, o homem responsável por trazer a primeira maior adaptação de quadrinhos para o cinema com Superman (1978), finalmente vir à vida de como teria sido o seu Superman II antes de sua saída da produção por diferenças criativas que nas mãos do diretor Richard Lester tornou o filme do Superman em uma comédia pastelão, tendo reescrito e refilmando uma parte substancial das gravações originais de Donner (soa familiar, não?!). 

Mas quando a versão de Donner foi lançada 20 anos depois, os fãs que clamaram por ela foram recompensados com a visão original do diretor, não apenas se mostrando como muito superior à visão original, mas fazendo para muitos o que é considerado a única e definitiva versão de Superman II, que alguns podem argumentar que está no mesmo nível ou até melhor que o primeiro clássico! A Liga da Justiça de Zack Snyder é instantaneamente outra dessas versões cinematográficas alternativas que provam isso, e que se discuta o quanto isso serve para comprovar como grandes exemplos e feitos da visão artística e autoral de diretores, não só se mostrando como um direito para qualquer cineasta, como também NECESSÁRIAS, independente do valor comercial que a indústria queira e demanda tirar do produto final, ou o resultado qualitativo, artisticamente falando!

Mas também, que se estabeleceu como um real evento, com fãs reunidos exigindo a visão de seu diretor se realizar, que se deu por dois anos à fio, apoiados pelo próprio diretor e toda a equipe que trabalhou no filme, promovendo nas redes sociais (e fora dela) subindo as hashtags #ReleaseTheSnyderCut em tudo que era canto visível e com milhares de seguidores se reunindo logo atrás em apoio, exigindo a versão lendária e tratada como uma fantasia por vários ou impossível de ser completada! E que prometia ser uma versão definitiva e integra à visão original de Zack Snyder que prometia ser diferente de tudo aquilo que o público viu originalmente no cinema!

E receberem exatamente isso aqui, e que ironicamente, acabou agradando pessoas além dos próprios fãs como críticos, os rivais sempre presentes de Snyder. Simplesmente porque a Liga da Justiça de Zack Snyder é apresentada como uma obra de diretor, um trabalho feito com amor, livre de correntes de interferências de estúdios; com uma narrativa coesa que > cada uma de suas longas 4 horas para aproveitar e contar a história que tem em mãos. Fazendo o filme que ELE queria, com SUA linguagem, caracterizações e escolhas!

E para aqueles que ainda persistem na ignorância e tentam diminuir o resultado da versão de Snyder dizendo ser o mesmo filme lançado em 2017, só que mais afetado, pedante e tão ruim quanto, bora encarar os fatos: se teve algo que a versão de 2017 teve como marca e destaque, foi algo que já havia afetado gravemente o Esquadrão Suicida de David Ayer onde o medo do produto final fez com que os estúdios gastassem todos os máximos de recursos em substituição de diretor e investimentos em refilmagens severas para tentar o máximo em aparar toda uma trama dentro de uma duração dentro ou na faixa de duas horas, e dar ênfase para um tom mais cínico, que parecia se importar mais com fazer piada e criar uma vibe de constante entretenimento fácil e mastigável.

Ou seja, o inverso de tudo que Snyder havia feito até então. E que em Liga da Justiça, com a substituição por Whedon no comando, atingiu um ápice destrutivo e vexaminoso, pois se Esquadrão Suicida ficou como uma bagunça estilística e narrativa completa, Liga ficou um monstro Frankenstein de pedaços dirigidos por Snyder, integrados junto à mistura tentativas de humor, marcas do outro diretor, sem qualquer afeto pelos personagens e longe de ter uma visão integral à história e seu propósito inicial.

Agora, para além de todas as diferenças que A Liga da Justiça de Zack Snyder SIM possui em comparação a outra versão, a sua principal diferença é a de que é realmente um filme com a visão de seu diretor presente de frame à frame, do inicio ao fim. E com uma narrativa que continua e progride o que Snyder havia fazendo desde Homem de Aço e que encontra aqui seu “desenlace” de forma épica. Assim como perpetuar seu almejo criativo em tentar evocar a imagética de divindade na concepção visual e tecnológica na construção estilística para a história desses personagens.

O primeiro maior ganho que o filme de Snyder consegue em comparação, seja com a versão anterior ou com seus filmes anteriores da DC, é que parece completo, sem partes ou fragmentos faltando, elementos alterados ou desprovidos de qualquer desenvolvimento, e sem pressa de passar por cima de todos os potenciais que apresenta; intocado por qualquer pessoa fora seu próprio diretor, sem intenções corporativas em seus arranjos ou linhas da história. Em vez disso, tem coração entrando em cada uma das linhas narrativas; a duração de quatro horas tem um objetivo e um propósito! Onde o que outrora se dizia ser inexistente, está aqui agora concluído, e fora ser um filme imensamente divertido e prazeroso de assistir, em seus melhores momentos, consegue ser glorioso!

E uma das coisas que a versão vem a mostrar (e atestar) é o fato de que Snyder realmente fez três filmes completamente diferentes um do outro, na mesma linha temática narrativa, e se completando ao longo da sua progressão. Enquanto Homem de Aço foi um pseudo Batman Begins de Nolan misturado com ficção científica, BvS era um thriller político com personagens de HQ aterrados em um mundo real e sombrio, enquanto que sua Liga da Justiça é que nem ler uma história evento dos Novos 52 nos quadrinhos. É grande, épico, estruturado em vários arcos de personagens acontecendo em simultâneo, e tendo uma aventura no meio. E a sensação é de como se estivéssemos lendo um daqueles encardenados de capa dura dividido em várias edições reunidas, formando uma só larga e vasta história.

Que tem em média as mesmas batidas e conclusão do enredo, Bruce Wayne/Batman (Ben Affleck) e Diana/Mulher Maravilha (Gal Gadot) formando a equipe que virá ser a Liga enquanto se preparam para impedir uma invasão interplanetária do vilão Lobo da Estepe se usando dos poderes das “Caixas Maternas”; só que tudo é tão mais bem explorado, com tempo para desenvolver e mostrar suas linhas sinuosas que podemos ver e compreender não apenas uma ameaça muito maior vinda do Lobo da Estepe como este poderoso ser cósmico obstinado, buscando conquistar o mundo na esperança de reconquistar o respeito de seu mestre Darkseid. Como ver nossos principais heróis fora do nível do espetáculo de super-heróis, tendo que lidar com seus passados ​​complicados e credos pessoais ao longo do caminho.

Que tira muita inspiração da obra-prima das HQs, Justiça de Alex Ross, que percorre todas as dimensões do universo de seus personagens em uma escala dignamente épica em proporção visual e escala, e que Snyder adota aqui em sua formulação épica de sua história. Que vai desde a gótica e sombria Gothan, às paisagens de Themyscira, dos oceanos profundos de Atlântida, para vilões de rua e ameaças cósmicas semelhantes a Deuses. Onde pulamos entre linhas temporais em uma trama que vai do longínquo passado com reinos e seres míticos, brevemente vai para dimensões galácticas sombrias e para o futuro apocalíptico e ameaçador, tudo num piscar de olhos.

É o universo DC colocado na tela, com traços de alguns dos elementos que fizeram a DC perdurar por quase um século nos quadrinhos, agora sendo colocados em formato cinematográfico. Que tá nem aí pro realismo e enfatiza o mítico heroísmo! E a tão longa e descompassada narrativa dividia em partes como capítulos literários (aqui 6 e mais um epilogo) permite a narrativa respirar tudo que tem, enquanto que (novamente) encarna o mesmo exato espírito e estrutura de um verdadeiro evento de quadrinhos de super-heróis, que precisa de várias edições para contar sua longa narrativa épica. Sem nunca a jornada parecer inchada, pois fortalece a história em questão, não tendo qualquer restrição de tempo, o filme encontra o momento certo para explorar a cada um dos personagens que estão na tela, desde is principais até os secundários, todos tendo pelo menos UM momento, nas 4 horas inteiras, para aparecer e destacar um momento memorável de seu personagem, deixando claro os momentos mais profundos para a equipe principal!

Se molda em um timing metódico e calmo, saboreia o tempo que tem em mãos e passa longos minutos construindo os diferentes arcos e segmentos de seus personagens, inicialmente com cada um possuindo um tom próprio, por vezes quase assumindo um tom contemplativo em certas cenas que você nem esperava que o filme fosse adotar tal tom, visual e musical (com a trilha de Thomas Holkenborg não deixando nunca de brilhar, variada, épica, evocativa, emocionante e excitante em todos os quesitos!). E que se para alguns soa pedante, para outros consegue funcionar lindamente como parte da construção mitológica de tais personagens!

A proporção de tela 4.3 adotada por Snyder, muitas vezes chamada de “pretensiosa”, não apenas traz de volta um formato de cinema épico clássico para seus frames, como quase cria os retângulos de revistas quadrinhos ganhando vida em tela, e a mistura não poderia ser melhor! Enquanto que as cenas de ação são praticamente as mesmas que vimos na versão de Whedon, mas que são TÃO incrivelmente melhores, empacotadas de energia, mais longas e ilustradas como uma difusão de puro entretenimento caótico e excitante que nunca se torna nem chato, mesmo que totalmente embalado com as habituais câmera-lenta de Snyder, o que é um caso de ame ou odeie.

E entre toda a enormidade de sua escala gigantesca, acima de tudo, encontra-se aqui um filme de personagem! Se a versão de Whedon os ilustrou como brinquedos gigantes ambulantes indo enfrentar o vilão de efeitos visuais borrachudo 2.0, reduzidos a diálogos cafonas e piadas horríveis, e onde a reunião da Liga mais parecia de roteiro do que algo realmente desenvolvido; aqui o filme busca com atenção e respeito mostrar o porque que esses personagens formam a Liga da Justiça, e mais importante, quem eles são!

O filme sem dúvidas aparenta jogar mais “seguro” em comparação com a ousadia BvS, tendo sim tom mais leve e com a presença pontual de humor. Snyder certamente por ouvir muitas reclamações “críticas” sobre seu tom estóico em BvS e Homem de Aço, ele visou aqui, junto com roteirista Chris Terrio, em encontrar o equilíbrio certo de uma aventura épica seguindo traços de Jack Kirby, com um tom mais sombrio e libertário da era dos Novos 52s e até mesmo das animações da DC, onde risos e frases de efeito podem surgir em uma cena, e na outra há cabeças explodindo e sangue sendo derramado em igual medida. E sim Snyder usa a classificação para maiores aqui para além do que apenas um punhado de palavrões, onde vemos a gama de poderes de heróis e vilões de uma forma brutal!

Enquanto que o humor em si é tão bem acertado, e sua maior parte empregado em volta do personagem do Flash de Ezra Miller (com uma presença também MUITO melhor aqui), que fica longe de destoar do tom centrado que o filme ainda possui em si. Que leva sua narrativa e personagens completamente à sério pois, além de todo o espetáculo, essa é uma história que, assim como os outros filmes de herói de Snyder, busca mostrar esses seres super-poderosos, como pessoas primeiramente! Que em um mundo que se encontra perdido em seu rumo, que uma vez enfrentando uma grande ameaça que coloca a existência da Terra em risco, devem encontrar algo que os unirá para um bem maior!

E esse algo se mostra ser a esperança, a esperança encarnada nas ações do Superman e do seu sacrifício! O filme não começa mostrando a morte de Superman apenas por razões de interligar os filmes, todas as introduções da trilogia de Snyder, não só serviram para mostrar a progressão de um filme para o outro, como mostraram significado na conexão temática entre eles! A esperança uma vez idealizada por Jor El em Homem de Aço (“eles se juntarão a você no sol Kal”); que Clark questionou seus poderes e seu papel no mundo como um fardo, atormentado pela opinião de todos sobre seu lugar nele (“eles vão tropeçar, eles vão cair”); mas o seu acreditar na esperança que levou ao seu sacrifício, e a esperança que ele inspirou através do mesmo, que agora se reflete em cada um dos heróis (“você vai ajudá-los à realizar maravilhas!”)

A esperança que desperta em Bruce Wayne / Batman a sua busca em consertar seus erros do passado e mudar suas formas violentas de agir, onde se mostra menos ranzinza, cínico, e superando as cicatrizes abertas do passado. Mostra uma atitude mais descontraída, ainda o Batman astuto, mas o Bruce Wayne focado e centrado, brincalhão nas horas vagas (mas sempre em um tom comedido ao personagem). Com Affleck mostrando uma faceta bem diferente do personagem, com uma aura mais radiante, esperançoso, e cheio de carisma que nos fazem abrir um sorriso em certos momentos.

E um Batman confiando principalmente na fé pura e simples, em vez da razão, o que é inicialmente apontado por Alfred (cuja presença aqui está mil vezes melhor e mais gostável – a cada cena sua é um sorriso no rosto que aparece), como um potencial perigo e que Bruce está novamente perdendo a razão dos fatos, crendo demais e não raciocinando a situação. O que é imediatamente proposital visto que o mesmo também foi movido por emoção ao invés de razão em BvS, enquanto lá ele era motivado por um ódio cego que o fez quase matar o Superman, sua fé aqui leva a ressurreição do Super e a União da Liga!

Auxiliado pela Mulher Maravilha, que bem diferente da humanista doce, positivista e com um discurso inspirador na ponta da língua que vimos no mais recente Mulher Maravilha 1984, aqui temos uma progressão da Mulher Maravilha de BvS, a guerreira que se escondeu da humanidade por todo o século XX vendo os horrores que humanos são capazes de cometer. E que em um momento de necessidade e perigo mortal para o mundo, ela voltou a dar as caras e agora age como uma verdadeira heroína, interrompendo assaltos como sua cena intro, interferindo assim nas ações conflituosas humanas. 

Mas sem qualquer pudor à vida já que ela usa seus poderes sem limites e arremessa sem dó bandidos em paredes e o sangue fica lá. Porém nada que distoe da sua moral e ideais inabaláveis frente da Liga e do papel de liderança que divide com o Batman, ou do seu coração tão doce e humano como ela brevemente mostra pra uma garotinha que acaba de salvar, e Gadot carrega tudo na doçura de seu sorriso, então é impossível falhar!

À medida que os membros da Liga se unem, não por meio de uma relação constrúida em volta de trocas de diálogos que levam a lugar nenhum fora mostrar personalidades idiotas e humor vazio como fora na outra versão, mas antes, por meio do ‘quem eles são’. Em seus passados compartilhado de perdas, traumas e solidão, mas principalmente, nos laços parentais que carregam, sendo suas fontes de principal inspiração para o alcançe de seus poderes!

Em Diana/Mulher Maravilha está o legado de seus ancestrais, a saudade eterna de sua mãe e de sua casa, que ainda vive, mas que por décadas não vê; em Arthur / Aquaman está seu destino de realeza, dividido entre sua descendência humana e atlante, visto como uma espécie de Deus para um pequeno povoado que ele ajuda trazendo mantimentos todo inverno, salvando vidas que se arriscam no mar, e mostrando além seu ar de brutamontes troglodita, um real coração quando mais tarde uma preocupação real com alguns membros da Liga como Cyborg, de certa forma se relacionando com a perda parental que o jovem sofreu e ele próprio já sentiu na pele com a perda de sua mãe que ainda o assombra e ele tem sua sobra de ressentimentos para com (assim como Cyborg tem para com o pai).

Já em Barry/Flash é seu propósito, para conseguir mostrar valor e sucesso na sua vida para orgulhar seu pai aprisionado injustamente pela falsa acusação de assassinar sua mãe. E cujo personagem ao invés do palhaço ambulante que só servia para dar as caras e soltar uma piada sem graça na versão de Whedon, ele aqui é sim o ponto leve da equipe, mas alguém que realmente você sente ser uma pessoa, entende o porque dele estar na equipe, para além de uma clara solidão e abandono de todos na vida, com claro sinal de ansiedade, mas que o disfarça com humor, é inteligente o suficiente para saber como lidar com a fisiologia de seus poderes de ultra velocidade (com um momento exclusivo de brilhá-los no seu mais alto potencial no final como talvez o maior herói de todo o filme em uma cena criada para ser pregada na sua memória e jamais esquecida. Que só te deixa embasbacado se perguntando como raios eles foram tão estúpidos em decidir cortar a tal cena da versão original).

E quanto à Ciborgue e seu laço de paternidade, como o Batman, é seu trauma (a perda da mãe), como o Superman, é a sua escolha de agir em nome do bem – no final, vindo de seu pai. No que é um arco de personagem TÃO mais desenvolvido, mostrando em vez de um mcguffin ambulante como ele se apresentava na outra versão, aqui ele se mostra o coração do filme! A performance de Ray Fisher contribui muito para o drama do arco de seu personagem, em lutar contra sua própria existência; a dor da perda de sua mãe e de si mesmo; sua incapacidade de perdoar o pai (Silas Stone – de um ótimo Joe Morton) outrora ausente no passado, embora o tenha trazido de volta a vida e luta para convencer que o filho tenha um futuro abraçando os dons que ele agora possui e usa-los para uma boa causa, onde ele encontre de volta o significado de humanidade ao se juntar à equipe e encontrar um propósito em sua vida!

Mas por último, mas não menos importante, Clark/Superman, que uma vez ressuscitado, no que ainda é uma sequência muito divertida, embora agora bem ameaçadora, dele sem memória, lutando contra a Liga, e então voltando para casa com sua amada enquanto ele calmamente recupera seu verdadeiro eu de volta. Assim como Cristo quando ressuscita entre os vivos, ele apenas mostra seu verdadeiro eu para a mulher que o amava, Maria de Madalena – ou no caso do filme, Lois Lane, e depois para sua mãe, Maria – Martha.

Os paralelos religiosos não ficam por aí, já que seu retorno marca o propósito semelhante prometido da segunda vinda de Cristo à terra, para trazer a salvação chave para a humanidade: Ele mesmo. O último membro restante, aparecendo aqui no último minuto para ajudar a Liga a derrotar o mal. Voltando agora usando seu novo traje preto, que não só serve como uma bela referência para o Retorno do Superman nos quadrinhos, e como se encaixa perfeitamente com a sua descedência Kryptoniana, como fora mostrado em Homem de Aço, cuja veste preta era a cor original da casa de El. 

Mostrando através dele ouvindo as vozes de seus pais, Jonathan e Jor-El, enquanto ele está se preparando para voar, que ele está finalmente aceitando suas origens alienígenas, juntando com sua criação na Terra, cumprindo seu arco iniciado em seu primeiro filme e se completando aqui, com ele se tornando uma entidade plena de bondade, uma força da natureza pronta para prevenir e erradicar todo o mal, tudo que é emocionalmente glorioso de se ver!

Até um vilão como Lobo da Estepe consegue ser tão melhor aproveitado como até aprofundado. Onde ao invés de ser um boneco inflado que mais parece uma bruxa mal feita com diálogos risórios que quase mostravam um complexo de Édipo severo,não só ele se mostra como uma real ameaça contra os heróis, como também recebe o nível certo de profundidade, se mostrando como um lacaio desgarrado, em busca de redenção e honrar seu legado. Formando quase uma imagem religiosa de um anjo caído, querendo recompor sua visão frente à sua crença devota, nesse caso à um Deus do caos e sombrio que é representado em Darkseid, cuja breve presença já é capaz de deixar o nível de sua ameaça cósmica muito bem resplandecida! E certamente apenas um cara como Zack Snyder seria capaz de fazer um personagem, feito completamente em CGI, com feições alienígenas animalescas claramente irreais (mas palpáveis), ser um personagem bem desenvolvido, e até digno de pena, até certo momento.

Até a presença e aparições de outros personagens como o Caçador de Marte, que é revelado ser o personagem de General Swanwick (Harry Lennix) esse tempo todo. Que se à primeira vista mais aparenta ser um elemento fan-service que apenas está ali para dar o típico parecer de futuras continuações, na verdade mostra como se encaixa como outro personagem inspirado pelos feitos do Superman e seu sacrifício.  E que, assim como Clark/Kal-El, possuí uma história muito similar. Um alien que viveu entre humanos, com medo de se expor ao mundo pela forma como reagiriam a ele e sua existência, mas que escolheu se revelar e ajudar aos outros como o faz com Lois, que passa boa parte do filme vivendo no luto da perda de seu amado sem vontade para continuar a viver ou trabalhar, e sai desse estado de real depressão apenas por partilhar de um diálogo com o Alien que se disfarça de humanos (como ele se disfarça de Martha nessa cena) e sabe sentir e agir como um. E bem no finalzinho, mostrar se juntar aos melhores dos melhores!

Elementos infinitos que estão cobertos em torno do filme de Snyder e, assim como os filmes que vieram antes deste, cada vez mais mostram a maneira como ele procurou criar este universo, indo em um caminho tão distante da fórmula da Marvel. Em vez de um longo set-up para os grandes encontros épicos nos filmes eventos, ele adaptou e trouxe os personagens se juntando ao longo de apenas três filmes, não como uma forma de pressa para alcançar o sucesso do rival, e sim contanto com a memória afetiva que os fãs, como ele, e o público casual de filmes de super-heróis, tem desses personagens, costurando um mito à outro e contando suas histórias se convergindo entre a mesma, reformulando-se suas jornadas. E o que já é épico, se torna ainda maior conforme avança!

Se na poesia épica os eventos da Ilíada se formulam para a Odisséia com Homero, que mais tarde é conectada pelo poeta romano Virgílio a sua Eneida. Ou como por vezes na Mitologia as histórias de Hércules o levava a interagir com a história de Jasão e os Argonautas, e por aí vai. E em meio aos contos no nível de uma epopéia de escala imensa e fantasiosa,  Pode conter traços e significados alegóricos quanto filosóficos, mas no filme de Snyder, não há nada mais do que a boa e velha história de super-heróis em uma aventura em busca de derrotar o mal e salvar o mundo. Assim como no BvS, o clichê das usuais trama de super-herói está lá, mas suas motivações e resultados vão um pouco mais além do que apenas isso. 

Porque além de suas conexões internas com passados semelhantes e conexões parentais problemáticas, a luta da Liga ilustra algo mais puro! A procura de uma cura. Curar o mundo do marasmo mergulhado em desesperança, medo, divisão em fronteiras de ódio. E a cura se encontra nessa união, que faz se sentir como eles formam uma verdadeira equipe, não apenas de amigos, mas de pessoas que compartilham o senso de responsabilidade e o desejo de proteger o mundo. Os elevando assim, tanto visualmente quanto textualmente, na busca iconográfica de Snyder, ao status onde os heróis e deuses são colocados, eternizados como mitos que podem trazer o melhor de nós!

Embora o filme seja completamente íntegro às intenções originais de Snyder de estabelecer o futuro que ele tinha em mente para o universo DC no cinema, e embora isso possa nunca vir a acontecer, as últimas cenas servem para formar quase que como uma espécie de meditação. Como na cena do pesadelo apocalíptico do Batman, liderando a nova liga em uma ‘Terra’ de ninguém, com o Coringa servindo como um aliado.

E tem algo de pura poesia em ver esse quadro, onde mesmo no precipício da derrocada da civilização humana, o palhaço do crime e o morcego ainda continuam nutrindo sua clássica rivalidade ainda viva, provocando um ao outro como dois fantasmas discutindo sobre um passado já à muito morto. O que remanesce no fim de tudo, é exatamente o que são, objetos, arquétipos, os seres míticos lendários que são, sem mais nada ao seu redor para comprovar sua existência do que se não o seu expressar tão familiar e integro às figuras que são e conhecemos, vivendo no seu próprio imaginário fictício.

E é isso que a Liga da Justiça de Zack Snyder mostra ser no final…, um canto do cisne, uma sonata final do que poderia ter sido, uma maneira diferente de trazer histórias de super-heróis à vida, com ação brutal, pseudofilosofia, encarnações fantasticamente memoráveis ​​em um blockbuster com uma narrativa tão pretensiosa feita pra perdurar por décadas! Absolutamente vulgar, mas também profundamente verdadeiro, fiel ao seu próprio conhecimento e amor por cinema, e pelo que procurou criar nele com os personagens que tanto ama.

A Liga da Justiça de Zack Snyder também pode ser vista como quase uma autobiografia do diretor de certa forma, detalhando não apenas suas lutas com a adversidade, mas também sua vindicação criativa através do sucesso desse filme, e o que significou para ele. Não terminando por motivos de ego, mas por sua filha, For Autumn, a coisa que ele mais amou no mundo inteiro e perdeu durante a produção, de um filme que ele foi retirado das rédeas cruelmente.

Assim como também é uma história sobre pessoas aprendendo a lidar com traumas, dores, superando o impossível para alcançar a grandeza, encontrando a vitória na união, encontrando respostas na fé! E no final, Snyder conseguiu isso! Honrou seus leais fãs, honrou seus personagens, honrou sua visão sendo posta em completa forma na tela de maneira emocionante em pensar por tudo que o filme passou, e no que no final entregou! E nos deixando querendo mais, foi sua vitória final.

Raphael Klopper – estudante de jornalismo

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