Visitas chegando, sentamos todos à volta da mesa. Ninguém preocupado com crises econômicas ou doenças vigentes. Crianças correndo pela sala, e todos aparentemente felizes com as máscaras sociais que a maioria de nós carrega. Todos se abraçam e se beijam ao se despedir. Parece um sonho, mas não é. A notícia de dois dias depois preocupa a todos: inflação, novas vacinas para as variáveis e tudo mais.
Mas, você deve estar se perguntando, onde está a história de tomar um porre e comemorar?
Na maioria das famílias que se reúne para comemorações existe um vinho sobre a mesa, um uísque, uma cerveja… Mas e daí? Beber é tão bom!
Agora pergunto a você: o que temos a comemorar para beber tanto?
Então, se não é comemoração de algo realmente diferente, um novo negócio, um relacionamento que vale a pena, da vida, do sucesso, do que se trata? Será que de fato usamos a bebida como um elemento que nos dá prazer e traz diversão ou como encobridor de faltas? Como fuga para nossas mazelas, frustrações? Conheci uma mulher que me dizia que a forma de resolver seus problemas com seu namorado era sair no sábado e “beber todas”. Então, perguntei-lhe se no dia seguinte seus problemas tinham sumido ou resolvido, ela baixou os olhos e disse que não. E possivelmente havia uma ressaca inconfessável rondando sua cabeça.
Muitas pessoas saem para beber ou compram MUITAS bebidas, até mesmo tendo um estoque em casa. Os amigos chegam, bebem. Os problemas aparecem, bebem. Comemoram o aniversário, bebem. Brigam como o companheiro ou a companheira, bebem. Estão felizes de arrebentar, bebem. E por aí vai. Uma vez li um cartaz com uma frase que me fez todo sentido. Dizia assim: “se fosse sólido, eu comia, mas como é líquido, eu bebo”. Acrescento aqui a frase do prof. Renato Dias Martino sobre esse assunto: “O superego é solúvel em álcool” o que significa dizer que a bebida nos faz esquecer os problemas muito temporariamente, pois tudo volta depois do porre. A bebida dissolve as proibições, a censura, traz a falsa sensação de estar livre, ajuda a esquecer um pouco das coisas que nos obrigamos a fazer ou achamos que “devemos”, ou seja, o sujeito, quanto mais bebe, menos se apoia no “deveria ser”. Então, quanto maior a rigidez do superego do sujeito, maior é a revolta com relação a isso. Assim, quando o sujeito se embriaga, ele consegue se “libertar” desse superego, o que traz certa sensação de alívio ou permite que ele manifeste toda a sua revolta passando dos limites e fazendo todas as besteiras que ele não conseguia fazer antes.
Porém, esse “esquecimento, apagamento ou dissolução” é extremamente provisório. Essa é a alegria e o prazer que as drogas lícitas trazem, mas que se trouxessem um prazer real e durável, em vez de “droga” teriam o nome de “prazer”. Apesar de existirem milhares de tipos de drogas, vou comentar aqui sobre o álcool pois é permitido por lei, encontramos em qualquer esquina e qualquer cretino nos oferece, aquele amigo/a que nunca ofereceu dinheiro para pagar nosso aluguel nem muito menos um prato de comida sequer, porque, claro, o prazer está em ir para o fundo do posso e levar alguém junto, né? Então, ele/a oferece para que você possa encher a cara, “meter o pé na jaca”, como se diz, e tomar aquele porre sensacional! Só esquecemos do dia seguinte, da dor de cabeça, do mal-estar e da ampliação dos problemas pela perda de mais um dia gasto em vão, achando que o divertimento era certo.
Um pouco de relaxamento é necessário, mas até quando pretendemos nos anestesiar?
Anestesiar sim, porque, se você não sabe, o álcool (etanol) é depressor (exerce ação inibitória) do sistema nervoso central (SNC), assemelhando-se a anestésicos e a outras substâncias sedativas, como os benzodiazepínicos e os barbitúricos. Portanto, beber éuma tentativa de se anestesiar e negar a realidade circundante. Uns negam a realidade, mergulhando numa melancolia profunda. Outros negam, se drogando com maconha, comida, sexo, álcool e muitas drogas mais, degenerando sua saúde física e mental. E vão se matando aos poucos. Outros, no mais extremo dos atos, que não resolve nada, até mesmo praticando o suicídio.
Se você quer relaxar, diminuir o estresse da vida, não será negando o que nos cerca que conseguirá. Se você come uma caixa de chocolates porque ama, mas é diabético, por exemplo, corre o risco de aumentar sua glicose e entrar até em coma. Se gosta de sexo, mas o faz sem camisinha, ou de maneira indiscriminada, pode pegar uma doença e se lamentar pelo resto da vida. Não dá para negar a realidade, mas dá para amenizá-la. Como?
Quantas vezes precisaremos cair e levantar?
Os extremos são péssimos em tudo na vida. E beber em excesso não relaxa, só por momentos isso pode acontecer. Há somente uma sensação de liberdade, como expliquei acima. Portanto, como você pode amenizar o enfrentamento com a realidade sem ter que se drogar? O que seria o uso moderado de uma substância e quando você saberia que não é um adicto? Você sabe distinguir entre as duas coisas? Você sabe o que é adicção? Uma taça de vinho pode fazer bem por ter resveratrol, um potente antioxidante que previne doenças cardíacas, melhora a circulação sanguínea, mas seu uso abusivo, como qualquer droga pode levar à dependência química. Uma caneca de boa cerveja, artesanal, que geralmente tem os produtos mais naturais ou orgânicos, pode ser rica em antioxidantes que previnem doenças cardiovasculares, ter vitaminas do complexo B, entretanto, qual é o limite para ingerir essas substâncias com álcool? Até que ponto elas vão fazer bem ou mal a você? Quantos copos são a medida saudável?
Estudos apontam que adolescentes estão conhecendo e usando álcool cada vez mais cedo. Entre 12 e 13 anos vão a festinhas e bebem com seus pares. E o pior é que o consumo de bebidas alcoólicas está associado a uma série de comportamentos de risco, envolvimento em acidentes de trânsito, violência sexual e participação em gangues. Além disso, está fortemente associado à queda no desempenho escolar, dificuldades de aprendizado, prejuízo no desenvolvimento e estruturação das habilidades cognitivo-comportamentais e disponibilidade afetivoemocional do jovem. Seu consumo causa modificações neuroquímicas, com prejuízos na memória, aprendizado e controle dos impulsos.
Se você é pai ou mãe, penso e só penso, que isso talvez pudesse ser uma boa preocupação para se tentar viver de modo mais saudável, procurando dialogar e estimular seu filho à reflexão sobre estes assuntos e observando seu próprio comportamento na frente deles, pois se as crianças ou adolescentes têm contato diário com adultos que bebem “socialmente” ou se embriagam, muito provavelmente acharam e acharão natural fazer o mesmo, você não acha?
Se você tem problemas com drogas e/ou com o enfrentamento da realidade (diga-se de passagem, frustração também), não negue a você a chance de encarar a vida de frente. Venha para a psicoterapia! Será um prazer conversarmos.
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Beeeiju…
Janice Mansur é escritora, poeta premiada, professora, revisora de tradução,
criadora de conteúdo e psicanalista (atendendo online).
Contemplada no Top of Mind Awards Internacional UK 2022,
na categoria Escritora Destaque do ano.