O Eternamente subestimado e ÓTIMO Homem de Aço!

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Se alguma vez houve um super-herói que veio passando por um tremendo estresse, tentando se recuperar no cinema e indo em busca de uma constante e difícil tentativa de retornar aos holofotes tão necessários de aclamação, sucesso e, claro, relevância, era (e ainda é), sem dúvida, o Superman. Impedido apenas por uma fama imerecida que o leva ainda constantemente de ser chamado de “chato” e “desinteressante” por alguns, enquanto outros ainda vivem presos no tempo dos filmes altruístas do Superman dos anos 70 e 80, e tendo aquele Superman como o modelo definitivo do herói, sustentado ainda pelo Superman – O Retorno de Bryan Singer que ainda invocava exageradamente aos filmes dirigidos por Richard Donner e Richard Lester.

Os filmes de Christopher Reeve, o primeiro uma eterna obra-prima, o segundo a falha continuação (mas salva tremendamente pelo corte do diretor), o terceiro a comédia pastelão, e o absolutamente vergonhoso quarto; estarão todos sempre lá para nós, mas a ideia de uma reformulação completa da tradição e mitos do que o público sabia sobre o Superman no cinema, era mais do que bem-vindo, como necessário. Assim surgiu O Homem de Aço, dirigido por ninguém menos que o infame nome de Zack Snyder, que definitivamente entregou um Superman diferente de tudo que havíamos visto até então nos cinemas. Com o resultado sendo o suficiente para ter não apenas uma reação polarizadora e divisiva, como muitos dizendo “não é meu Superman”.

Mas indo além de polêmicas, tudo que pode ser dito como a mais definitiva e afável verdade consensual sobre este filme é que com certeza Homem de Aço é um filme … estranho … e definitivamente único, entre as várias versões do personagem, até mesmo as dos quadrinhos! Carregando um amontoado de influências e traços que vão além do cerne dos quadrinhos, embora ainda sejam fortemente ligados à eles, mas se encaixando em tantas outras coisas que é quase atordoante o quanto que eles conseguiram encaixar nesse nível de ambição e ideias de inspiração. O suficiente para deixar o público casual se sentir confuso e perdido sobre o que está assistindo, mas é uma coisa boa visto que como o próprio tom do filme, e seu rumo narrativo, parecem de fato imprevisível.

Começando com os 20 iniciais minutos em Krypton, que é um grandíssimo curta apocalíptico de ficção científica misturado com fantasia pulp, misturando ainda uma dinâmica Shakespeareana entre os personagens tão grandiloquentes na enfatização dramática; seguido pelo drama de meia hora sobre um homem perdido no mundo, em busca das respostas de quem ele é, que parece dirigido por um Terrence Mallick menos exagerado, repleto de flashbacks entrelaçados, cheios de questionamentos em narração off, contados como se fosse um pequeno emaranhado de elipses e fragmentos; em seguida, iniciando um breve filme de invasão alienígena que cobre o segundo ato – mais um pouco de ação estilo Dragon Ball Z.

Terminando com o grande clímax ala filmes de Christopher Nolan – estendido por mais de uma hora, com diálogo expositivos pesando nos detalhes de enredo, todos os mocinhos trabalhando juntos como se fosse o clímax de O Cavaleiro das Trevas Ressurge misturado com A Origem e até Tenet, e ainda recheado com a grandiloquência visual de Snyder, deixando edifícios em cinzas e ainda mais ação estilo Dragon Ball Z, seguido de um belo final ala Nolan com o mesmo exato estilo de corte abrupto após uma frase de efeito (e que ainda é meu final favorito para um filme do Superman até hoje!).

Agora qualquer um perguntaria: como raios isso tudo pode ter algo a ver com o Superman?! Bem, é uma resposta complexa, assim como é um filme complexo, ou segundo algum de seus detratores… ”tenta” ser. Enquanto que a direção inicial da premissa parece querer avançar em trazer essa narrativa ala Batman Begins, tentando ser uma nova franquia de revitalização do personagem, o mesmo que o filme de Nolan foi para o Batman. E tendo o próprio Nolan envolvido aqui com créditos na história, e tendo o mesmo co-roteirista, David S. Goyer (outro nome infame entre as adaptações de quadrinhos), tudo parecia apontar nessa direção. Uma abordagem “completamente” realista do Superman, se vendendo a partir da idéia de: “E se o Superman realmente existisse em nosso mundo real?!”.

Bem, tirando o fato de que já tínhamos filme em Corpo Fechado de Shyamalan, e que já havia levado o mito do super-herói a um grau EXTREMAMENTE fundado no realismo de nosso mundo, enquanto que O Homem de Aço ainda carrega em si o lado fantástico com forte presença em si, ainda com claro e fortes traços de ficção-científica, que já faziam parte das origens primordiais do personagem. O que faz o filme realmente chegar a ser um verdadeiro épico de ficção científica em seus maiores momentos, especialmente nos primeiros minutos em Krypton, aspirando toda uma carga clássica do gênero:

Que se estende desde Duna de Frank Herbert nas partes de guerra civil entre as casas nobres e a estética medieval empregada com elementos futuristas; os recém-nascidos kryptonianos que são reproduzidos artificialmente é basicamente tirado de Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley (1931), enquanto que a ideia de criação para trabalhos específicos é tirada de First Men In The Moon de HG Wells; enquanto que Kal-El / Clark descobrindo o alcance de seus poderes lembra muito o próprio John Carter de Edgar Rice Burroughs, que se você pensar bem é a mesma história só que ao contrário, de um homem normal que quando se vai foi para outro planeta, não só ele é tratado como um alienígena, mas sua atmosfera original lhe garante super- poderes sobrehumanos nessa nova atmosfera, sendo visto como um Deus; para mais tarde se tornar um filme de desastre de invasão alienígena completo bem no estilo Independence Day, mas com Superman nele.

Enquanto no centro de tudo, mostra carregar uma trama reflexiva sobre a própria natureza da existência do Superman em nosso mundo. Ele deveria existir?! O que um homem faria com tais poderes?! É de fato necessário uma entrega e investimento por parte do público para realmente aceitar e comprar toda a base da premissa, que pode ser mesmo de revirar os olhos para aqueles que apenas querem se divertir com um filme de quadrinhos de super-herói e não têm que pensar em algo mais profundo enquanto assiste, e achar o mesmo pretensioso por tentar ser algo além do que uma mera diversão – a geração criada pela Marvel e os filmes MCU nos últimos anos. Mas o filme é exatamente aquilo se que apresenta ser e propõe, onde Superman é mostrado como um basicamente Deus que vive em nosso mundo real, onde cada uma de suas ações e confrontos refletem profundamente na sociedade e na humanidade ao seu redor. Não importa se você gosta desse conceito ou não, apenas o é, e assim, funciona!

Embora que a maior parte das grandes críticas ao filme, constantemente comentadas e discutidas, se baseiem solamente na interpretação do personagem, com “argumentos” que vão desde: “QUE SUPERMAN MAIS DEPRIMENTE E SOMBRIO É ESSE?!”; “O Superman NÃO MATA!” (e ele não mata mesmo, ele aliás sofre quando o tem que fazer aqui no filme – em uma das cenas mais efetivas do filme).. Mas isso se baseia apenas nas queixas de fãs que são os mais terrivelmente comentados e discutidos, e que simplesmente se desviam do caminho das outras críticas mais importantes em relação ao tom, a concepção, à direção. Sabe né, as coisas de filme! E a esse respeito, eu também tenho que dizer que: sim … eu ainda posso ver um filme bem decente aqui!

Uma produção de blockbuster de orçamento absurdamente alto que é ABSOLUTAMENTE vulgar, mas estou sempre aqui para defender como Snyder é um dos diretores que podem transformar esse estilo vulgar em puro autorismo. Mesmo que o filme pareça constantemente picotado e apressado à um nível irritante, mas é porque ele nunca quer perder tempo, buscando sempre ser preciso e enxuto em todos os segmentos da história, e até mesmo nos temas que busca explorar em sua narrativa que, depois de um certo tempo, se torna bastante repetitivo, mas nunca menos ressonante graças ao espetáculo que o cerca. E tudo isso advém de uma marca registrada básica que Snyder carrega desde 300, e é basicamente transferida para todas as suas adaptações de quadrinhos desde então, onde ele sempre busca emular e adequar a linguagem das revistas em quadrinhos dentro do formato cinematográfico.

E Homem de Aço é uma HQ INSANA, com Snyder dirigindo como se fosse uma! Onde cada pequeno manuseio dos frames, o ritmo da montagem, é definido para despertar a sensação de que o que estamos assistindo não é apenas um filme, mas a própria leitura de uma história em quadrinhos, com o ritmo do filme carregando a fluidez do movimento para uma das tiras retangular de quadrinhos para outra, e até mesmo a lógica do filme de narrativas interligadas, e constantemente variando de um momento dramático a outra cena de ação explodindo do nada, é praticamente uma dinâmica completa de uma revista em quadrinhos ganhando vida!

Apenas façam essa experiência de um dia lerem qualquer história em quadrinho, seja de Frank Miller, Jack Kirby ou Alan Moore, e depois imediatamente assistam Homem de Aço e me digam se a sensação de ler as histórias em quadrinhos é a exata mesma a de assistir o filme. Foi o mesmo com Watchmen e como seria mais tarde com Batman vs Superman, mas em um nível totalmente diferente. E olha que esse foi definitivamente o filme em que o estilo de Snyder está presente de uma forma muito reduzida, mas de alguma forma, ele ainda consegue encaixá-lo bem no meio deste estilo mais cru, “realista”.

Com isso, tudo se resume a um filme que entra naquela pequena categoria especial, onde ou você vai amar ou odiar, escolha seu veneno e viva com ele. E você já pode perceber qual caminho esse texto escolheu tomar quanto a isso. Mas em relação ao nosso personagem-título, vamos tocar no óbvio: enquanto o Superman de Reeves, logo no primeiro filme de Donner, após ir atrás de suas origens e se lançar no seu seu caminho de super-herói, ele instantaneamente se torna um símbolo supremo de justiça, amado e idolatrado por todos. Mas Homem de Aço não é isso, por mais que as pessoas o critiquem por isso, porque nunca teve a intenção, ao contrário, a história contada aqui se passa apenas nas fases iniciais da história de Clark descobrindo suas origens como Kal-El. O próprio início do Superman, descobrindo seus poderes pela primeira vez, percebendo o alcance deles e as consequências dos mesmos.

E Snyder, Nolan e Goyer abordam a história fazendo uma pergunta principal: se um homem com essas habilidades, de poderes e força divinas, estivesse realmente habitando em nosso mundo, em uma era perpetuada pelo exacerbado poder militarista pós-11 de setembro, fortemente representado pelo design de produção militarista e imagens de tragédia de guerra, como a gigantesca máquina de terraformação que gradualmente reduz os arranha-céus de Metrópolis à cinzas, levando sabe-se lá quantas vidas com ela; aonde e de que lado esse homem ficaria?! O nível de destruição aqui, que muitas vezes é chamado de fetichismo de destruição exagerada, nunca é um caos gratuito como é premeditado pelas ações divinas dos super-seres, lutando na terra, desencadeando tragédias para as pobres almas frágeis.

O que se torna um choque de pura mitologia, colocada dentro de um espectro do mundo real, com um homem de habilidades que podem ser vistas como dignas de um Deus, estando acima das complexidades políticas de um mundo habitado por medo e divisão. Conforme ilustrado nas pequenas características humanas do filme, seja o motorista bêbado idiota, os indivíduos cheios de palavreados, os militares rápidos em apontar suas armas, mas também no povo humilde e bom, como o casal Kent, a jornalista determinista de Lois Lane – de uma bem boa Amy Adams, claramente se divertindo com o papel e dando essa ar doce, mas ainda com lingua afiada para Lois, e que sabe logo de cara desde o começo que Clark Kent é o Superman, fugindo daquela identidade secreta óbvia que simplesmente não serve mais hoje em dia, que é uma muito bem-vinda atualização.

E para um homem assim, o filme vai lidar com a moralidade do próprio poder, em ter poderes divinos e o que fazer com eles e com que propósito. Será que ele seria como Zod, que através de sua armadura e traje escuro em contraponto ao Superman, representando um líder com crenças e ações dignas de um ditador, com uma total falta de moral e um desejo de expandir seu império e salvar sua espécie, independentemente do custo das vidas de meros mortais, vislumbrando apenas o bem estar de sua espécie “de superiores”. Com uma atitude implacável e cruel, mas mostrando imensa nobreza em sua performance, perfeitamente encarnado por Michael Shannon, e sendo a antítese antagônica perfeita de Kal-El / Clark.

Que usa suas habilidades e poderes onipotentes de forma benevolente e protetora das pessoas por quem ele zela, com humildade, solidariedade, o ‘Alien’ que encarna uma persona de Cristo de um todo poderoso que pode zelar por nós, enquanto viver entre nós (e os símbolos religiosos não param por aí). Mas no meio de todo o escopo épico de ação insana, o que realmente se destaca e funciona fundamentalmente em Homem de Aço, é que é um filme de personagem! Que leva seu protagonista a embarcar numa viagem de autoconhecimento, que o levará a diferentes cantos dos EUA, tendo como bagagem apenas os valores que os seus pais lhe ensinaram, moldando o homem que se tornará.

Do pai adotivo de Jonathan Kent (um excelente Kevin Costner) que o protegeu do mundo por medo de como eles tratariam seu filho, mas deixando para Clark a escolha do caminho que ele deverá seguir com seus poderes, até o momento certo para isso. E a persona de seu pai biológico Jor-El (um ótimo e bem esnobado Russel Crowe), ainda rondando ao seu redor (em uma nova versão bem interessante da fortaleza da solidão), contando-lhe sobre as esperanças que ele tinha para seu filho quando ele enviou-o para a Terra, para ser melhor do que sua geração Krypton foi, para trazer a salvação e o caminho certo para a humanidade (como eu disse, os simbolismos religiosos estão por toda parte).

Conduzindo-o por um caminho enquanto constantemente questiona ao espectador: o que ele pode se tornar?! Talvez … o Superman que todos nós conhecemos. Mas um Super-homem que comete erros, que é conduzido por sentimentos e ações humanas reais. Fica bravo, ruge em batalha, mas quem também é tímido, meigo, bebe cerveja enquanto assiste futebol nas horas vagas, sorri como uma criança quando aprende a voar (em uma cena de vôo que ainda é capaz de te dar arrepios na espinha), um filho amoroso, na verdade um completo filhinho da mamãe, mas algo que consegue ser de uma extrema adorabilidade palpável, e com verdadeiro sentimento genuíno presente nas cenas que ele compartilha com a Martha Kent de Diane Lane.

Mas também se põe em pose de todo poderoso, mas não é chamativo, na verdade tímido, mas confiando que está fazendo o que é certo, fiel à sua escolha, a escolha da humanidade! E Henry Cavill interpreta isso mais do que bem e inicia o que poderia ter sido um futuro brilhante explorando o alcance de seu personagem. Bem, alguns de nós sabemos como isso acabou, mas pelo que ele realiza aqui, ele é definitivamente um bom Superman! Que é acompanhado pela trilha sonora estrondosa de Hans Zimmer, que foge do tema icônico original de John William, mas invoca o espetáculo de forma muito própria e excitante!

E onde finalmente os fãs realizam seus sonhos molhados e vêem o primeiro filme do Superman que ilustra o alcance de seus poderes em uma escala destrutiva e ação incrível – para aqueles que chamam de “demais” e “exagerada”, você simplesmente não entende ou possui o doce prazer de se ver destruições massivas em filmes – incluindo a melhor a luta mano a mano, tech a tech do Superman até hoje; alinhado com todos os temas que um filme moderno do Superman deve carregar e tem a coragem de ir além ao ilustrar um herói imperfeito, mas com o heroísmo que cresce a partir de seus erros e experiências, ao mesmo tempo em que questiona os efeitos do público de sua presença no mundo real. Se os super-heróis são um fenômeno incorporado em nosso mundo de ficção, como isso mudaria quando esse fenômeno fosse colocado em forma de vida?!

Engraçado como que na época o grande investimento e a confiança da Warner neste filme se refletia no fato de estarem à espera de um começo de uma nova trilogia do Cavaleiro das Trevas, mas com Superman, mas Snyder não deu a mínima para isso e fez um épico de ação e ficção científica de quadrinhos. Varrendo com ambição e uma escala abominável que pode nem mesmo ser suficiente para atender e encaixar a todas as ambições que embala, mas que tem coração suficiente e muita personalidade para evocar-se em ser uma das versões mais únicas do Superman. Não uma perfeita, mas muito especial!

Raphael Klopper – estudante de jornalismo

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