Ele/a era feliz até que…
… perdeu o amigo para as drogas, perdeu o pai para o câncer, a avó jovem para o avanço da idade, perdeu os pais num acidente de carro, perdeu o emprego que sustentava a família, a relação de fidelidade que tinha com o companheiro, perdeu a ilusão de ser a pessoa que achava que sabia tudo, perdeu o grupo de amizade de infância que se distanciou pela desigualdade, perdeu a casa em morava por tantos anos para um acidente da natureza, perdeu o cabelo para alopecia, perdeu a juventude quando não estava preparada, perdeu o dinheiro num jogo de azar ou quando fechou a empresa, perdeu familiares para os regimes autoritários, pessoas que desapareceram e nunca mais voltaram.
TODA perda é um luto.
Sabe quando você pensa que vai lidar com as perdas facilmente por que as pessoas dizem que você é forte? “Ah, ela/ele é forte!, Vai se dar bem.” “Já já isso passa.” “Daqui a pouco, eles se esquecem, saudade vai embora com o tempo…” “ele arranja outro trabalho”. “Há coisas mais importantes na vida”. O que as pessoas não comentam é a dificuldade em se desapegar, é a dor da ausência, é o vazio que fica quando o outro parte, é a falta, o buraco, o rombo. E pior ainda, além do que já se está sentindo, é ser totalmente invalidado em seus sentimentos.
Esse buraco que a perda de alguém provoca é terrível, embora saibamos não poder perder algo que nunca tivemos. As pessoas não são nossa propriedade. Não possuímos ninguém. Quando uma pessoa sai da sua vida, por vários motivos, o mais difícil é perder o costume, é lidar com esse vazio da presença, com todo o prazer que ela/ele trazia para você e não trará mais, apesar de todos os inconvenientes.
A perda de um trabalho, quando era nossa base de sustento, pode ser destruidor, mas com certo amparo de amigos ou parentes, se tolera. Porém o que diz respeito às pessoas, no meu ponto de vista, é bem mais complicado.
Quando meu irmão viajou, por muitos anos, minha mãe punha pratos à mesa contando com ele, pois seu inconsciente não aceitava o fato dele não estar mais ali. Ele estava presente para ela.
Quando alguém morre, só vai para um plano em que não a vemos ou para alguns só volta para a terra. Entendemos racionalmente até, mas como isso é difícil de sentir!
A separação, o divórcio, por exemplo, é sempre mais doloroso do que a morte, apesar de ambas serem um luto. Quando alguém morre acreditamos ser a fatalidade da vida, mas quando alguém se separa de nós é muito difícil de aceitar porque somos feridos em nosso narcisismo. Embora seja saudável uma parcela razoável de narcisismo, associado a uma autoestima suficientemente ajustada e a um senso de autovalor, propiciadores do desenvolvimento de um ego integrado, a ferida nesse narcisimo é em virtude de que na separação a sensação é de ter sido abandonado, trocado e rejeitado. Ocorre uma dor no que se tem por imagem e no amor que se tem por si próprio. Essa dor pode ser tão intensa que a pessoa não se reconheça mais. Para pessoas que sentem dessa forma não há tolerância à dor da perda, a ideia de fracasso é enorme. Daí, elas podem reagir com frieza, agressividade ou sadismo, ou manifestar angústia imensa por pensar que não consegue sobreviver sem o objeto de amor.
Nós, em geral, não aceitamos a perda porque ela nos fala de não termos posse sobre o objeto, de perdermos o controle. Pensamos que controlamos a tudo e a todos. A perda ou luto nos fala de quanto precisamos desapegar dessa ilusão e olhar um pouco mais para nós e nossas possibilidades. É preciso começar a se bastar, é preciso que possamos ser suficientes. Precisamos ser felizes e estar bem com nós mesmos. Ah, como isso é difícil!
O luto não tem fim, ganhamos e perdemos pessoas, coisas e situações sem cessar, pois a perda é uma das várias faces das grandes metamorfoses. A vida é um estado permanente de transformação. Por isso, se faz necessário olhar para as perdas como algo natural da vida, como a “vida acontecendo”.
Como você lida com suas perdas? Como elabora seus lutos? Precisa pensar caminhos?
Se você não está conseguindo suportar suas perdas e precisa elaborar seus lutos não perca tempo, procure ajuda.
*Janice Mansur é escritora, poeta, professora, revisora de tradução,
Psicoterapeuta e Psicanalista (atendendo online) e
criadora de conteúdo no Instagram: @janice_mansur
e no canal Better and Happier https://www.youtube.com/@betterhappier7501
Contemplada no Tof of Mind Awards Internacional UK 2022,
na categoria Escritora Destaque do ano.
Fonte foto capa: https://br.freepik.com/fotos-gratis/veja-como-as-pessoas-estao-ficando-mais-fortes-juntas_19115823.htm